Festival tem dois componentes inevitáveis: adrenalina e stress. Você passa doze horas no cinema, lançando legendas, enfrenta problemas, pequenas irritações se acumulam. Inclusive porque sua vida lá fora não para. Acabou o papel higiênico, o Nescau e você não tem tempo de ir às compras. E tem outros trabalhos rolando ao mesmo tempo que você tenta manejar da melhor maneira possível e não perder as datas de entrega para o festival e para o resto do mundo. Ao mesmo tempo, você chega em casa e está tão na pilha apesar de só ter dormido seis horas que não consegue simplesmente deitar e dormir. E aí você vai dormir tarde e dormir pouco de novo e de novo voltar para casa na pilha após um longo dia. Quando eu era mais nova, tinha mais energia para enfrentar essas coisas. Hoje em dia me falta um pouco de paciência. Eu tento ser zen, nem sempre consigo. Tem dias em que eu queria ter a disposição do Dalai Lama. Ficaria mais fácil assim.
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
terça-feira, 29 de setembro de 2009
Afinidades literárias
Achei uma entrevista com Manoela Sawitzki que recentemente lançou seu romance Suíte Dama da Noite pela Record. Recentemente dividi uma mesa de bar com ela e apesar de não ter tido a chance de conversar com ela (eu estava sentada longe dela) tudo o que eu tinha lido a respeito do romance dela me interessava. E agora, olhando por alto a entrevista (no meio do festival não tenho tempo para ler nada), dei de cara com este trecho que reflete exatamente como eu penso sobre o ato de escrever.MANOELA: Sou intuitiva no processo de criação, na concepção dos personagens, na forma como elaboro o enredo, mas bastante cerebral durante a fase da reescrita. Acredito demais na reescrita e acho que o tempo é um excelente editor – porque o tempo também nos edita. Agora, a intuição também está carregada de referências, é resultado da busca, do acúmulo e do processamento de muitas fontes distintas. De alguma forma, tudo o que li, assisti, ouvi, toquei, enfim, tudo o que vivi e senti até o instante em que escrevo um texto acaba imprimido, está ali. A teoria literária faz parte do pacote e certamente me guia, só que de uma forma quase invisível – em hipótese alguma se coloca entre mim e o que estou escrevendo. Nunca elaborei escaletas, nem para os romances, nem para as peças, pelo simples fato de que muito do meu prazer está nos sustos e nas descobertas que faço à medida que a história avança.
A única diferença é que eu nunca estudei Letras. Não entendo rigorosamente nada de teoria literária. E sempre desconfiei que conhecê-la me atrapalharia. Aprendi a escrever de forma instintiva, escrevendo simplesmente, e continua sendo assim. A entrevista pode ser encontrada aqui.
A única diferença é que eu nunca estudei Letras. Não entendo rigorosamente nada de teoria literária. E sempre desconfiei que conhecê-la me atrapalharia. Aprendi a escrever de forma instintiva, escrevendo simplesmente, e continua sendo assim. A entrevista pode ser encontrada aqui.
Primeiro susto
Todo santo festival tem um problema técnico qualquer. O computador não quer ligar, a lâmpada do projetor estoura faltando dez legendas para terminar uma sessão de imprensa, o projetor misteriosamente está mais alto do que devia e a legenda começa a ficar cortada apesar de você ter testado tudo antes da sessão começar (e claro que você não pode parar a sessão para consertar o problema). Hoje o computador e o projetor apagaram nos cinco minutos entre eu botar tudo no ponto, dar um pulo na farmácia ao lado do cinema e voltar. Corre, segura a sessão, o técnico vem ver o que é, tudo se resolve também em cinco minutos. Mas geralmente é um só. Depois tudo corre tranquilamente até o fim. Pelo menos, a essa altura do festival, a gente torce que seja assim. Em compensação, acho que tive meu melhor lançamento do festival todo até este momento. Era um filme russo sem qualquer tipo de legenda na tela para ajudar, duas horas e meia de duração e eu devo ter perdido no máximo umas dez legendas em mais de duas mil. O arquivo estava ótimo e por vários instantes, parecia que eu sabia russo, consegui entender o ritmo da língua. Hoje foi um bom dia.
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Perigos do festival
No meu segundo dia de festival eu enfrentei um grande desafio. Pedi uma salada Caesar no Ateliê Culinário do Cine Gávea e recebi uma tigela monstruosa, cheia de alface e pão e gorgonzola e sei lá mais o que. Era enorme o bicho. Foi complicado achar um jeito de comer aquilo sem me sujar toda. O outro grande desafio é se manter acordado quando você já virou duas noites na semana para fechar algumas emergências. Não importa o quanto o filme seja interessante, você dorme mesmo. Existe uma outra categoria, que eu chamaria de roubada mesmo, que são aqueles filmes que entre a versão que foi apresentada para tradução e a cópia enviada para projeção, foram mexidos, às vezes de tal forma que você não reconhece mais o filme que traduziu. Resultado, você entra no cinema esperando um filme e acaba encontrando outro. É quando o pobre lançador se perde completamente. E para se achar de novo é preciso contar um pouco com a sorte. Claro que a platéia não sabe de nada disso e você é ameaçado de linchamento. Uma graça. Lançador de legenda devia receber um adicional de insalubridade.
sábado, 26 de setembro de 2009
Premiere Brasil
Primeiro dia de festival, passo o dia no Odeon. Muita gente, muitas filas. Há coisas que nunca mudam no Festival do Rio. Uma delas é o ritual das apresentações antes dos filmes. Os diretores do curta e do longa são chamados ao palco, cada um de sua vez. Cada um de sua vez chama toda a equipe para o palco, agradece a Deus e todo mundo que já conheceram, os patrocinadores, mãe, periquito, papagaio. O curioso de ver toda aquela gente ali no palco é constatar que, ano após anos, as mulheres estão sempre produzidas e os homens não. No máximo, estão com um blazer sobre a camisa social, jeans e tênis. Tem gente que faz uns discursos longuíssimos, outros pagam mico. E você fica ali sentada, torcendo que terminem logo de falar para o filme começar e você poder sair do cinema num horário minimamente decente, voltar para casa e desmontar na cama. É hora de dormir.
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
É amanhã
O Festival do Rio começa amanhã e já começo a sentir aquele tradicional nervoso pré-festival que dura até eu lançar meu primeiro filme. Aí tudo vira correria e eu não tenho tempo para pensar em mais nada. Wild Fingers rule!
terça-feira, 22 de setembro de 2009
Despedida
Eu me despedi ontem de minha grande amiga. Ela voltou para os Estados Unidos. Vai ser difícil esperar até a próxima visita. Saudade.
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
E vai começar a festa
Reunião no domingo para distribuir as sessões entre os lançadores de legendas. Para quem não sabe, os lançadores são aquelas criaturas esquisitas com um laptop ou micro no meio da sala, apertando botões no teclado durante o filme. São eles que estão jogando aquelas legendas na tela para que você possa entender perfeitamente diálogos em chinês, árabe e tailandês. Daí o termo técnico, tacadores de legendas. Fora da sala de projeção, os lançadores podem ser identificados pelo crachá, o ar blasê de quem já fez aquilo trinta mil vezes e as olheiras que vão se aprofundando conforme o andar do Festival do Rio. Também estão frequentemente munidos de laptops e pen drives e caderninhos com longas listas de filmes a serem lançados e você os vê trabalhando nos lugares mais improváveis para terminar a tradução de um filme que vai passar amanhã na sessão das 14h. A reunião em si já é como aquelas festas de Natal das famílias, faz um ano que nos vimos pela última vez e ficamos trocando velhas histórias de festivais passados, como soldados falando de campanhas passadas. Rola muito papo, muita risada, todo um rol de piadas internas que ninguém de fora vai entender, como perguntar se vai ter sessão na praia este ano. Rola comida também, uma farta mesa de café da manhã (uma cortesia incrível de nossos valorosos líderes) para os pobres coitados que estão enfiados num cinema congelante às nove da matina no domingo, tentando entender a letrinha miúda da longa lista de sessões do dia no papel que é distribuído entre o pessoal. Há quem prefira certos cinemas, certos horários, quem queira lançar determinado filme para poder assisti-lo enquanto lança (porque, do contrário, você realmente não vai ter tempo para vê-lo), quem quer lançar um filme porque o traduziu e é um daqueles filmes que é uma pauleira. Como todas as famílias, somos ruidosos e afetuosos e sempre curtimos nossos reencontros. Sinto falta disso no resto do ano, trabalhando sozinha em casa. Este será meu décimo-segundo festival e não acredito que já faz tanto tempo. Ao mesmo tempo, é bom poder ser veterana, sentir a calma de quem já viu de tudo um pouco. Sexta-feira eu estarei no cinema. E vai ser muito bom.
sábado, 19 de setembro de 2009
Terras baixas again
Li no New York Times ontem que Terras baixas, de Joseph O'Neill, vai virar filme com roteiro de Christopher Hampton (leia-se Ligações perigosas) e direção de Sam Mendes. Esse filme eu vou querer ver.
Fotografias
Sempre há um componente visual em tudo o que eu escrevo. Quando inicio um novo texto, preciso ter um título e uma foto, uma capa que expresse minhas idéias sobre o texto. Eu fazia isso na época em que entregava meus trabalhos no colégio. Tinha de ter uma ilustração na capa, mapas, desenhos ilustrativos do tema do trabalho, talvez cópias Xerox de fotos. Antes de ter acesso a computadores, eu fazia essas coisas usando cópias Xerox de desenhos, cópias de catálogos de Letraset, passava horas recortando e montando as letras, só para criar uma capa para o manuscrito. A origem de tudo isso, eu sei, é minha mãe, uma gravadora, que sempre fez questão de levar os filhos para ver exposições, fosse em Nova York ou Washington ou Rio de Janeiro. Quando morávamos em Nova York, vivíamos indo ao Metropolitan. Lembro claramente de ir ver com ela filmes sobre pop art no Guggenheim e uma exposição das esculturas de bailarinas do Degas no Metropolitan. Nossa adolescência foi passada indo a vernissages dos amigos de minha mãe, outros artistas. Eu até trabalhei no Parque Lage por uns seis meses e vi a montagem de exposições, participei até de uma delas, empoleirada num andaime por três dias, pintando uma parede. Na mesma época, eu estudava na PUC e descobri a fotografia, passei a andar para cima e para baixo com uma câmera que meu pai me emprestou. Depois passei anos sem uma câmera, mas meu fascínio pela fotografia continuou. Hoje, felizmente, tenho uma câmera digital e voltei a fotografar coisas e pessoas. Inclusive, todas as fotos que coloco aqui no blog são fotos que eu tirei, como a que ilustra este post. Está demorando um pouco a recuperar o meu olho de fotógrafa, mas aos poucos, ele vai voltando.
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
Bonequinha de luxo
Um artigo genial no The Guardian de duas semanas atrás sobre as diferenças entre a personagem Holly Golightly conforme vista no texto original do Truman Capote (que a via como uma Marilyn Monroe que nunca virou atriz) e sua personificação pela fabulosa Audrey Hepburn no filme. O link é este aqui.
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
Arqueologia
Talvez seja porque eu escrevo, talvez porque sempre fui fascinada por documentários sobre civilizações antigas, mas eu tenho essa eterna mania de escavar meu próprio passado, remexer em papéis velhos, cartões postais esquecidos no meio de livros que não terminei de ler, fotos desbotadas. Muitas vezes é estranho olhar para trás e ver por onde se passou, ainda mais porque tenho uma tendência a esquecer muitas coisas. E remexer na papelada provoca duas reações inevitáveis. Uma é alergia, por causa da poeira. A outra é começar a pensar em idéias para novas histórias. Passei esta semana revendo minha correspondência e alguns textos antigos e disso tudo tive idéias para um novo texto. O que vai sair daí eu ainda não sei.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
Terras baixas
Uma ótima resenha pelo Daniel Piza do Netherland, de Joseph O'Neill, publicado aqui com o nome de Terras Baixas. O link é este aqui.
A vida e a escrita
No The Guardian, uma coluna linda sobre a arte de escrever e de como a vida entra naquilo que escrevemos. Aproveito para citar um pequeno trecho:
But stories are there to be told, and each story changes with the telling. Time changes them. Logic changes them. Grammar changes them. History changes them. Each story is shifted sideways by each day that unfolds. Nothing ends. The only thing that matters, as Faulkner once put it, is the human heart in conflict with itself. At the centre of all this is the possibility, or desire, to create a piece of art that talks to the human instinct for recovery and joy.A coluna pode ser encontrada aqui.
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
The week in review
Esta semana que passou foi uma de fortes emoções. No reencontro com minha amiga de mais de vinte anos foi meio inevitável olhar para o passado e repassar não só a nossa história de amizade, mas tudo o mais que aconteceu nesse tempo, o que, me ocorre agora, é uma idéia muito usada em contos e romances porque é algo natural e verossímil. Talvez até use isso numa coisa que ando pensando em escrever. Mas para mim, o importante foi ver que mesmo sendo uma amizade à distância, quando estamos juntas, nossa sintonia não muda e acho que é até melhor agora do que quando nos conhecemos. Isso, para mim, valeu a viagem.
domingo, 13 de setembro de 2009
Cartas, o retorno
Eu adoro correspondência, receber cartas de amigos pelo correio ou por e-mail, adoro usar cartões postais que me mandaram como marcador de livro ou para marcar onde estou no meu caderno. O que eu ocasionalmente esqueço é que as cartas também são uma máquina do tempo. Você se depara com eventos e emoções que esqueceu, histórias que ficaram um pouco diferente na lembrança com a passagem do tempo. Hoje vou ler cartas e mais cartas.
sexta-feira, 11 de setembro de 2009
Nadando
Lendo um pouco do romance Swimming, de Nicola Keegan, antes de dormir, encontrei um trecho que achei genial. Nunca tinha lido nada parecido.
I'm nine months old and the longest I've slept at one time is one hour and forty-three minutes. I think my name is Boo, but it's not. It's just one of the many things I'll be called: Boo, Mena, Phil, Pip, but the name on my birth certificate, Philomena, has four syllables and will be the first major disappointment in my life. No one will use it until I get to school and the nuns insist. I have various hobbies that consume me: kicking, screaming, pulling things down, kicking again, crying. Lately, I've been experimenting with howling like a wolf. I sit up in my crib three hours before dawn, grab the bars with both fists, and keen at the moon. I've started to pull myself around on the floor and, when no one is looking, roll myself up in electrical wire, get my fingers stuck in air-conditioning vents, and scream until someone yanks me out. Yesterday, I gnawed down half a candle, pooping it out this morning with horrible grunts as my mother wept: I just turned my head for a second.
Reencontro
Hoje pude me reencontrar com uma amiga de longa data a quem não via há muitos anos. De repente foi como se tivéssmos nos encontrado ontem. E, ao mesmo tempo, estamos em momentos bem diferentes de nossas vidas. O chato vai ser ter de me reacostumar com a sua ausência depois que ela for embora.
terça-feira, 8 de setembro de 2009
I love the smell of new books in the morning
Não há nada melhor que receber logo cedo de manhã um livro que você encomendou pela Livraria Cultura e esperou meses para chegar. E você não só recebe o livro, como ganha uma folha de plástico bolha para estourar de brinde. Aí voce abre o livro e dá uma lida nas primeiras páginas e antecipa o prazer que terá ao lê-lo. Logo, logo, vou botar esse livro na mochila e levar para a Travessa para ler aos sábados. By the way, o livro que eu recebi, Swimming, de Nicola Keegan, foi uma indicação da Adriana Lisboa no blog dela. Valeu, Adriana.
domingo, 6 de setembro de 2009
Domingo
Acordo cedo e tudo o que eu quero é poder voltar para a Travessa, escrever mais um pouco. Mas aí olho para a pilha de coisas que preciso entregar esta semana sobre a minha mesa e sei que não vai dar para "matar o trabalho". Por outro lado, esse intervalo de uma semana está tão perfeitamente instalado na minha rotina de escrever que eu desconfio muitas vezes que eu preciso desses sete dias para processar todas as ideias que me passam pela cabeça e deixá-las no ponto para minha próxima ida ao escritório. Agora vamos à luta.
The Gathering
Eu li The Gathering, de Anne Enright em fins de 2007, curiosa porque não só o livro ganhou o Booker Prize daquele ano, mas também porque a história do romance dela lembrava muito a história do meu romance. Adorei o livro e, aproveitando a presença da Anne Enright na FLIP deste ano, decidi reler o romance. E a segunda leitura foi ainda melhor do que a primeira. Ela tem um texto genial em que mistura dor, saudade, humor, ironia e um monte de outras coisas. Até aproveitei a FLIP para comprar mais dois livros dela e pedi autógrafo para todos. Não sei negar o meu lado tiete. A seguir, um pouco do texto de Anne Enright:
It does not matter. I do not know the truth or I do not know how to tell the truth. All I have are stories, night thoughts, the sudden convictions that uncertainty spawns. All I have are ravings, more like. She loved him! I say. She must have loved him! I wait for the kind of sense dawn makes, when you have not slept. I stay downstairs while the family breathes above me and I write it down, I lay them out in nice sentences, all my clean, white bones.
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
Porque amanhã é sábado
Quando chega a sexta, é um alívio. Porque amanhã é sábado e vou voltar para a Travessa, voltarei para meu escritório e para meu romance. E torço para que fique nublado, porque dia de sol não combina muito comigo. Só não quero que chova. Quando chove, a Travessa enche e eu me sinto um pouco invadida. Eu vou lá há tanto tempo que é como se o lugar fosse a minha segunda casa. Se você quiser me encontrar, vá lá aos sábados.
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